cinco anos de silêncio e uma tal de falta

E parecia, sim, que a vida tinha perdido alguma cor

Que o frio gelava mais, 

que o sol já não brilhava da mesma forma

E eu só queria que me devolvesses

A tua lição

E me explicasses

Que a dor é por ti

Que o meu coração ficaria para sempre furado por uma tal sede de ti 

Que já nenhuma lágrima poderia consolar uma saudade tão grande

(tão indizível)

Eu andava de mão dada contigo

E agora não alcanço mais a tua palma

A mão com que me empurraste para que crescesse

Grito a Deus que te quero no Céu à minha espera

Que te quero encher de beijos

Que te quero ver outra vez devolveres-me o olhar

Porque por agora

Viverei sempre do lado de fora

Da casa onde ainda estavas, onde ainda me falavas

E onde ainda nos podíamos abraçar.


Eras Tu (Natal 2023 II)

Na noite fria

Que ontem vivia

Eras Tu, quem insistia


Não me apercebia

Que me seguravas a mão

Que me levantavas do chão

Sempre que caía


E por graça Tua

Hoje é Natal

E nasces outra vez

Nasces para mim 

Trazes a Esperança


Porque eras Tu:

Na noite escura

Eras Tu

Na tarde fria

Eras Tu

No pranto e na dor

Eras Tu

No que não percebia

Eras Tu

Na força que não tinha

Eras Tu

Foste sempre Tu, meu Jesus pequenino

Quem nascer me fez 

uma e outra e outra vez

Escadinha para o Céu (Natal 2023 I)

Estava ali a Luz

e era pequenina

uma estrelinha de Amor

que dormia na palhinha


Acordávamos naquela noite de Amor

Para os melhores dias

Aqueles que nos pedias, Senhor

Que soubéssemos Viver


E lá estavas Tu

Pequenino, dormindo ainda

Nu, e nos braços de uma Mãe

Que é nossa também

Porque a quiseste oferecer


Dá-nos Senhor pequenino,

Natal todos os dias

para subirmos devagarinho

degrau por degrauzinho

A escadinha para o Céu




A vida

De dentro do peito do Tudo fui buscar uma força

Que todos somos ao nascer

A força do grito da pneuma a ser soprada

Além-pessoa

Além-ser


Essa força que tantas vezes é vergada

Essa força não-sem-nada

É uma força emprestada dura de matar e impossível de perder


A vida


Desenhada

Não é um padrão confuso

É um nó sem pontas soltas 

Impossível de desfazer




Degrau II (esboço)

Na cidade da cabeça

há estradas de pensamento

bairros com vielas

curvas com profundas valetas

Há vias e travessas

Abertas nas janelas


Quando percorro esses sulcos

encontro vida nas novelas

(Que os vizinhos berram operetas

se as opiniões forem diversas)

viram-se e revolvem-se por dentro

e depois aparecem por fora 

às avessas


São

controversas as escadas

em que às vezes tropeço

é que ficam bambas quando peço 

Que a alma suba outro degrau

Degrau I

Eu vivia num degrau, 

num tal de eden, 

era grande, mas não havia muito espaço.

Não tinha muito por onde rir 

e, sempre que chorava,

Era sozinha com a minha companhia.

E não era uma pessoa,

ai e não era alguém

ai e ninguém escutava!!

Ninguém ouvia.

porque era um silêncio aos cacos

que como gota escorria

pelo meu regaço.

pelo meu regaço e que ninguém colhia.


e que ninguém 

colhia.

Numa casa onde Não há Gritos

Nesta casa, onde não há gritos, nunca se gritou. 

Nunca se discutiu o que havia para jantar. Nunca se preferiu este político ao outro. Nunca se pediu a Jesus Cristo que viesse ver isto. 

Nunca se disputou um lugar à mesa e Nunca se berrou de fome ou de dor. 

Nunca se fez cara feia nem se detestou. Nunca se devolveu um presente errado. Nunca se revirou os olhos em despeito. Nunca se gritaram gargalhadas por nenhuma alegria e 

Nunca se foi parvo. Nunca se foi ridículo. Nunca se brincou.

Nesta casa, há a marca dos anos por cima do pó. (Que passaram a correr estáticos)

Nesta casa, Nunca se berrou em escândalo.
Nunca se chorou de raiva
Nunca se cerraram dentes.
Nunca se odiou.
Nunca se disse "agora" apaixonadamente.
Nunca se deu.
Nunca se perdeu.
Nunca se arriscou.

Nesta casa
Ainda hoje se geme e murmura

Nesta casa Nunca se foi e Nunca se Viveu

Porque

Nesta casa

Nunca se gritou.

Em que bolso da vida cabe a doença?

Se perguntares, não parei.

Não me detive a olhar para ela.

Não se me escapou nenhuma vida com que tenha sonhado ter sido diferente.

Olhando para trás não se percebe nada,

Senão a dor imensa da saudade de poder ter ser.

Podia haver diferente, pode sempre haver diferente.

Mas não se diz, nunca se diz e assim pode-se não saber.

Se entendo, não. Se compreendo? Com o abraço todo! 

Pode cansar por ser maior que eu 

E certamente não cabe num bolso

Mas, a saber, 

não trocava esta fragilidade minha por nenhum poder de Colosso 

Passo Perguntoso (ou o andar-vida quando pára)

Era um passo à frente do outro, um passar a tremer, um andar hesitante. 

Estava a fugir, não sabia de quê, acho que tinha só medo.

Ao chegar àquela esquina, reparou num roxo forte a ocupar o céu todo, mas roxo não estava certo.

Era bonito, de alguma forma afetava-a, ansioso. Ao mesmo tempo, habitava-a, como náusea que agonia.

Era uma pergunta

Mas ela não a punha, então, também a não veria responder.

(Porque era roxo)

O Lugar do Silêncio (Natal III 2022)

Se o lugar do silêncio não conforta mas inquieta, pensa em Jesus

Que és Sua ovelha predileta, que nasceu para ti, que te salvou na Cruz

Pensa que também sorriu, que também sofreu que também pensou, que também chorou, que não desistiu, que antes insistiu, pra poderes viver!

Pensa nessa Luz, que seduz
Pensa nesse Amor que vence o medo,
Pensa no Caminho que a Estrela sempre aponta.

Pensa que é por ti,
Que Jesus sorri
Sem que te dês conta!!

Quero tanto em Ti morar! (Natall II 2022)

Um anjinho cantou-me ao ouvido

que haverias de chegar

Que esta terra Te veria nascer, crescer, e nos resgatar

Hoje vens cá dentro,
ao meu coração falar

Meu menino Jesus!
Tão maior que eu, essa Luz!
Meu menino Jesus!

Quem diria que haveria um lugar no Coração de Tudo o que É,
Feito de Amor Infinito,
De propósito para mim, e
que mais ninguém pode ocupar!

Nasces hoje de novo, meu Bom Jesus!!
Leva-me a Ti,
(Que eu hei-de a Ti chegar!!)

Leva-me ao Teu Coração,
E que esta noite no meu Te acolha:
Que quero tanto em Ti morar!!

Onde é que Jesus não está? (Natal I 2022)


No olhar de um outro que nos procura? Jesus está
Na nossa dor? Jesus está
No que não vemos? Está Jesus
No que não compreendemos? Jesus estará
No que perdemos? Só Jesus dá!
No que esperamos? Com Jesus, vamos lá!
Quando choramos? Se Lho entregarmos,  Que tesouro fará!
Onde estamos? Jesus sempre estará!
Se nos perdermos? Ele nos procurará!
E se temermos? Ele nos sossegará!
Se nos cansarmos? Ele nos acolherá!
Se desistirmos? Ele por nós esperará!
Se nos afastarmos? Ao nosso lado Caminhará

Esta noite?
Para mim, para ti, Jesus Nascerá!
E se cá dentro O buscarmos?

Onde é que Jesus não está?

Pai

Sabes, meu Pai, meu amor,

tenho saudades de te ver sorrir

de te sentir o calor das tuas mãos e do beijo na tua face

trouxeste-me à vida assim simples,

nas mãos do teu amor

do amor que tinhas à Mãe

do amor que partilhaste e que me deu vida

(colaboraste com Deus)

Fui a menina dos olhos teus

E agora que partiste sinto-te doer 

mas perto

À distância de um pequeno salto 

E tento sentir chegar-te

Pertinho

Chorando ainda

Que estás por detrás desse véu, 

que ainda nos separa um abracinho!


Sento-me naquele banco

Onde descansávamos do passeio a pé

e anseio

Ter-te perto outra vez

sabendo onde estás

e já como é             longe

Teres partido!

I

 

Perscrutei as veredas de um caminho

Onde decidida me queria percorrer

O frio queimava um andar sozinho

Entre eu que respirava

E o que estava a acontecer

 

Estava a sulcar na terra fria

Um vinco entre a alma e o doer

 

E à janela, despedida,

Uma outra eu

Que cantava por sofrer

 

II

 

A pena que empunhava ao escrever

Roçava nas linhas

Que escrevia

 

Eram toscas formas de viver

Formavam formas de entender

 

E essa pena que empunhava ao escrever

Sofria

Sofria por saber

Que sem mãos não escreveria

 

 III

 

Ao ler-te esta manhã, verso

Pintei-me de universo

Vesti-me de manhã e saí

 

Vi flores

Vi sorrir

Vi maneiras de estar e de fugir

 

Vi que mais que ver, devia ir

Encontrar-me

Resgatar-me

E seguir

 

IV

 

À beira do fim das coisas

Tropecei no tempo

Eram roxas as papoilas ao vento

 

E volteei contra essa areia

Que havia perto das papoilas

 

Sem querer, agarrei-me a uma

Como se a quisesse absorver

 

Essa imagem com que sonhei não ir com o vento

Está ainda longe do que pinto quando tento

Ainda presa ao sonho,

sobreViver

Diluída nisto de ser

Tinha mão nisto de viver

Diluida nisto de ser, tinha o que esperar, sabia o que dizer

Tinha mão, assim o achava

Mas sempre só se diluem as certezas quando se olha a realidade

(É que é tão nítida!)

Um dia cai-se e então descobre-se o chão

Outro dia voa-se pelo ar na vertigem de querer o céu todo abarcar

E por um breve instante surge em dúvida aérea a pergunta:

Que hei eu de ser?

Quem serei eu, já que quero Viver?

Amanheceu hoje

E foi para toda a gente que o sol sorriu, 

espraiou os seus braços de luz e aqueceu

um mundo que dele carece


Amanheceu hoje

E  por mais que a vida se constitua em problema,

O vento fez as folhas silvar

Nos ramos das árvores quietas

As aves continuam a ser um milagre 

como as papoilas que teimam em florescer

À beira da estrada,

Grandiosas na sua pequenez


E como será esse Amor que nos fez??


Amanheceu hoje 

outra vez

Pela primeira vez


Amanheceu hoje

E foi para toda a gente

Lonjura

Ondulam ventos que te trazem

de volta ao centro de ser

São como um sentir que saber é distante 

de integrar e viver


Quem tens trazido pela estrada de existir?

Um ter que distraia quem agrada,

Ou o que ainda esperas atingir?


Pensas às vezes que o caminho, 

esta estrada,

é mais longa 

demorada

e

distante 

do instante 

que é morada 

do teu querer e desejar?

Senteste-te agora, por fim, viajar?


Partida

Há uma corrente quente que se sente por não poder senão correr

Há uma questão que torna em redor de uma mão estendida:

E se viesses ver a vera vida?

Quem te demoveria de amá-la,

como se ama uma partida para onde se tem querer?

Letra, meu amor!

Letra, meu amor,

soletra a minha dor

em métrica,

em ardor


Letra, meu amor,

rasga o papel como se fosse

a pele doce e jovem de uma tal musa


Letra, meu amor,

incendeia-me sem queimar

que teimo querer-te para sempre 


Letra, meu amor,

Letra, meu amor,

Letra, meu amor!


Donde vieste tão concreta

quem te fez abstrata e inquieta,

expressiva, viva, êxtase e furor?


Letra, meu amor

diz-me o universo todo e além disso

que então eu, no papel submisso, 

te plasmarei num para-sempre

sem temor!



Ao Leitor IV

 O poema é problema 

ainda antes de surgir

é súbito desejo de exigir

O mundo todo de uma vez

Quem e como fez

com que um poema, em sua vez

súbito te caísse noema?

Quem te roubou, estático,

ao descanso de seres nulo?

Quem te beliscou?

Quem te fez dar esse pulo

e nascer outra vez?

cinco anos de silêncio e uma tal de falta

E parecia, sim, que a vida tinha perdido alguma cor Que o frio gelava mais,  que o sol já não brilhava da mesma forma E eu só queria que me ...